O famoso Comet (de que a fábrica só fez 3 exemplares) e que era o avião mais rápido da sua época, foi adquirido pelo Governo Portguês como simbolo de modernidade do Estado Novo. Originalmente batizado como “Black Magic”, o avião recebeu o nome “Salazar” em Portugal, tendo sido atribuido à aeronáutica militar e baseado em Sintra. Nesta pintura a óleo sobre tela, o “Salazar” prepara-se para uma passagem baixa sobre os hidro-aviôes da Marinha de Guerra Portuguesa, na Doca de Bom Sucesso.
Depois de ser deactivado o Comet foi esquecido tendo sido mais tarde adquirido por Ingleses. Segundo consta, esta aeronave sobreviveu e está a ser restaurada no Reino Unido para voltar a voar (mas com as cores britânicas … naturalmente).
According to the Bicesse Agreements, sign in May 1991, the two major opposing parts in the Angolan conflict (MPLA and UNITA) should demobilize their combatants and plan for elections on the following year.
Both political parties initiated the demobilization of their contingents but, allegedly, the modality of disarmament was somehow … tolerant … regarding the assigned side weapons. In result, everybody had a AK-47 Kalashnikov, and several magazines packed with ammunition, at home.
… keep the rest …
The demobilization, disarmament and reintegration (DDR) process is a matter to be dealt with by the local authorities. The International Community may help, advise, even sponsor, but they cannot interfere or substitute the governmental process.
According international sources in Luena, there was a major difference in the behavior of the UNITA and FAPLA (Governmental) demobilized people. The UNITA people gave their names, formed a column of three, and march right back to the Jamba (UNITA’s stronghold); the FAPLA people tried to sell their side weapon and moved to the local aerodrome trying to cash a ride to the Capital – Luanda.
A military pistol was being sold by 8000 Kwanzas and a Kalashnikov 12 000 Kwanzas. It was a modest price, equivalent to a volume of 10 cigarette packages. If the rifle’s butt had an artistic craved scene, the price would go up.
In Luena, the visible part of the (poor) DDR process was at the aerodrome. In October 92 there was about 400 demobilized FAPLA soldiers wandering in the facilities, which included the aircraft ramp and access taxiways. Some even had their family with them. They all waited the change to board an aircraft to fly out, preferably to Luanda. However, the UN aircraft could not take these people without a specific prior request from the Angolan Government to UNAVEM; only them we could help the demobilized on their quest.
One day, the Portuguese Air Force C-130 that had been tasked to support the United Nations regarding the electoral process of Angola, received an official request to bring 90 demobilized people from Luena to Luanda. There was no list and no criteria … just 90 people out of Luena … into Luanda. After they’ve landed, I went to the cockpit to great my comrades. I was noticed that he navigator, a friend of mine, was looking out of the window trying to see something on the wing. Something had hit the aircraft on the approach path.
PRT Air Force C-130 that has flown in that mission (6801) – Photo by Américo Jesus
– “It must have been a bird-strike.” – Said the navigator. – “When the birds are very small you can see it from here.”
Due to the boarding confusion outside the aircraft, I went out to help organizing the crowd. When we finally managed to put 90 bodies inside the Hercules, the doors closed and it went away; leaving several dozens of other demobilized, complaining violently for not having been selected.
Latter I’ve learned that the aircraft was not been hit by a small bird; it was hit by two bullets of Kalashnikov; one of them missed by centimeters an important mechanic component that, if it had been hit, the return flight to Luanda would have been seriously compromised.
De acordo com os Acordos de Bicesse, assinados a 31 de maio de 1991 pelas partes em conflito em Angola, durante o processo eleitoral Angolano que deveria decorrer em 1992, as duas principais forças em confronto militar (UNITA e MPLA), deveriam reduzir os seus efetivos e desmobilizar combatentes. Ambos os partidos iniciaram efectivamente a desmobilização de grande parte dos seus combatentes, mas, alegadamente, haveria uma grande tolerância no tocante a ficarem com as armas ligeiras que lhes estavam distribuídas. Em resultado disso, toda a gente tinha uma AK-47 Kalashnikov e vários carregadores cheios de balas em casa.
… e podes ficar com o resto …
A questão dos desmobilizados era, talvez, o maior problema na situação do pós-conflito que Angola viveu em 1992. Segundo constava (fontes internacionais em Luena), havia uma notória diferença comportamental entre os dois partidos em conflito.
– “Os desmobilizados da UNITA dão o nome no centro de desmobilização, formavam a três e regressavam à Jamba. Os desmobilizados das FAPLA (forças do Governo MPLA) tentam vender as suas armas no mercado e vão para o aeroporto à espera de transporte para Luanda.”
Uma pistola militar custava, no mercado local, 8 000 Kwanzas e uma Kalashnikov 12 000 Kwanzas. Um modesto valor que, no caso da AK-47, seria equivalente ao preço de um volume de tabaco com 20 maços de cigarros. Se a coronha da arma tivesse um trabalho de gravação esculpido, o preço seria um pouco mais caro.
Em Luena, a parte visível do problema dos desmobilizados, estava no aeródromo. Em Outubro de 1992, vagueavam pelas instalações do aeródromo cerca de 400 ex-militares das FAPLA, alguns acompanhados da respetiva família. Todos aguardavam um avião que os levasse para Luanda. Por definição, em qualquer conflito, as matérias relativas à desmobilização de combatentes são um assunto das autoridades locais. As Nações Unidas podem assessorar, apoiar ou até mesmo financiar, mas podem intervir na decisão e processo seleccionado para o efeito. É uma forma de fortalecer a autoridade e soberania Nacional dos governos empossados. Em resultado disso, as aeronaves ao serviço da ONU, entre elas um avião C-130 da Força Aérea Portuguesa em missão de apoio às eleições Angolanas, não tinham autorização para embarcar esta gente, a não ser que recebessem a tarefa específica para o fazer pelas autoridades de Luanda; o que acontecia pontualmente, através de um pedido expresso do Governo Angolano à UNAVEM.
C-130 Hércues que voou em Angola em 1992 – 6801. Foto de Américo Jesus
Um certo dia o C-130 português apareceu em Luena com a missão de levar 90 desmobilizados para Luanda. Dirigi-me à aeronave, a fim de saudar os meus compatriotas, colocando-me à disposição para os ajudar no que fosse necessário. Quando entrei na cabine de pilotagem – cockpit – a tripulação comentava que algo teria batido na asa esquerda durante a aterragem, mas não se via nada significativo daquele ângulo.
– “Provavelmente foi um bird-strike[colisão com uma ave]” – disse o navegador espreitado pela janela –“quando os pássaros são muito pequenos não se consegue ver bem!”
Depois de muita confusão no exterior da aeronave, lá se conseguiu carregar 90 passageiros, de entre as muitas outras dezenas que ficaram em terra a protestar violentamente.
Mais tarde soube que o impacto na asa esquerda do Hércules, não tinha sido uma ave, mas sim duas balas de kalashnikov. Uma delas ficou alojada a escassos centímetros de um componente fundamental da aeronave o qual, se tivesse sido atingido, iria por certo causar sérios problemas no voo de regresso a Luanda.
01MAIO1995 06:00 – Em plena viagem de carro pela auto-estrada de Zagreb para Belgrado, ao aproximarmos o Sector Oeste da Krajina, de repente, a serenidade da paisagem transformou-se num cenário de guerra. Havia explosões e movimentos militares por todo o lado. Inadvertidamente, nós estávamos no sítio errado à hora errada; tinha começado a “Operação Flash”, lançada pelos Croatas contra as posições Sérvias do Sector Oeste.
As Krajinas eram territórios habitados pelos Sérvios dentro da Croácia. Havia quatro Krajinas (Sector Norte, Sector Sul, Sector Este e Sector Oeste) sendo que o Sector Oeste era o menor de todas as Krajinas, e nada de muito significativa se tinha passado naquela parte da Krajina. Havia mesmo um ditado na UNPROFOR que dizia “Sector West is rest” … pois bem, naquele Dia do Trabalhador de 1995, a coisa parecia ter mudado … muito!
Embora o Sector Oeste fosse o mais pequeno, com apenas 558 quilómetros quadrados, sem grande valor industrial ou agrícola, tinha uma importância relevante porque ficava no meio da auto-estrada Zagreb-Belgrado, unido o território Croata a Norte, e continha uma linha de caminho-de-ferro importante. Para além disso, ficava na bacia de exploração petrolífera da Croácia (petróleo e gás natural) contendo sendo atravessado pelo oleoduto que transportava esses produtos. Para além disso, politicamente falando, os Sérvios tinham instaurado a sua própria república, sem qualquer ligação ao sistema legislativo/fiscal/governamental Croata. O Governo de Zagreb não tinha qualquer controlo ou influência sobre aquela parte do (alegadamente) seu território; e isso tinha de acabar! Estas eram os verdadeiros objectivos da Operação Flash: (re)estabelecer a soberania Croata sobre aquele território e controlar as linhas de comunicação a Norte do País.
Durante as primeiras horas do ataque Croata, os Sérvios tentaram ripostar. Para além da resposta bélica, os Sérvios assaltaram as várias instalações da ONU, prendendo e usando mais de 100 elementos da UNPOL (polícias da ONU) e outros elementos militares e civis das Nações Unidas como escudos humanos.
Conduzindo como maníaco, literalmente de pá sobre o acelerador, regressámos a Zagreb. O primeiro ataque Croata não conseguiu ultrapassar as defesas Sérvias e, entretanto, os Sérvios residentes nas outras partes da Krajina começaram a reagir. O Sector Norte disparou sete misseis (Orkan) sobre Zagreb, atingindo a Capital Croata na zona do Aeroporto (Pleso) e no Centro da Cidade. Naquele ataque de Orkans morreram sete pessoas tendo outras 205 ficado feridas.
Na Bósnia a situação de segurança subiu de “calma mas tensa” para “muito perigosa”, e recomeçaram os combates entre Bosniaks (muçulmanos) e Sérvios.
No dia 3 de Maio de 1995 estava tudo acabado … já não existia Sector Oeste. A Operação Flash tinha sido um sucesso da Guerra de Independência da Croácia. Durante aqueles 3 dias de combate as forças Croatas sofreram 42 baixas fatais e 162 feridos. Os Sérvios tiveram 283 mortos, 1.200 feridos e mais de 14.000 desalojados. Desalojados esses que se tornaram refugiados na Bósnia, aumentado a tensão étnica e os problemas humanitários naquele outro País. No final da Operação Flash somente cerca de 1.500 Sérvios restavam naquela parte da Croácia.Um número ridículo comparado com a sua população inicial. As Nações Unidas passaram a estar preocupadas com as horríveis acções de “Limpeza Étnica” que se seguiram.
Independentemente de “quem fez o quê, a quem”, os actos de limpeza étnica praticados nos conflitos da ex-Jugoslávia atingiram níveis de impensável brutalidade. Matavam-se os animais domésticos; queimava-se o gado vivo dentro dos currais; torturava-se e matava-se independentemente do sexo ou idade as pessoas da etnia oposta; atiravam-se cadáveres para os poços de água potável para a tornar imprópria para consumo, envenenavam-se tanques de água potável com raticida, combustíveis diesel ou com óleos; destruíam-se as casas; vandalizavam-se cemitérios; minavam-se e armadilhavam-se os acessos a povoações inteiras para evitar o regresso dos seus habitantes expulsos.
A Operação Flash destruiu o conceito da invencibilidade militar Sérvia … estava obvio que dentro em pouco outras acções iriam ocorrer … e ocorreram.
01MAY1995 06:00 – Driving on the highway from Zagreb to Belgrade, suddenly we were right on the middle of a Croatian attack to Sector West of the Krajina. “Operation Flash” had just started and we were on the wrong place, at the wrong time!
The Krajina were Serb populated territories inside Croatia. There were Several Sectors of Krajina (Sector South, Sector North, Sector West and Sector East) being Sector West the smallest one, were nothing “major” really happened during the Serb/Croatian conflict. There was an UNPROFOR saying: “Sector West is rest”. Although Sector West was a small territory of about 558 square kilometers, without any industrial or agricultural value to Croatia, it had a great importance because it was right in the middle of Croatian’s northern most important highway; it has a railway connecting Zagreb to the far East of the Croatian territory; it is on the oil and gas extraction basin, with a pipeline across it; and, politically speaking, it’s a rogue region within Croatia’s territory – with its own laws, taxes, government, etc. The Government of Croatia had no control or saying about the governance of an up most important region of its territory, central to Croatia’s northern lines of communications. That’s was the strategic value and the reason for Operation Flash – to restore the Croatian sovereignty and gain full control of the lines of communication.
The Serbians inside the pocket tried to fightback but they were outnumbered and under equipped for that fight. They immediately took hostage about 100 UN CIVPOL police officers, and other UN staff members that were operating inside Sector West as peacekeepers, and used them as Human Shields.
Driving like maniacs in an empty highway, we were completely helpless while the Serb mortars started to retaliate the Croatian attack, hitting positions dangerously close to the highway tarmac. We barely managed to make a “U” turn, and head back to Zagreb standing on the vehicle’s accelerator.
The Croat’s first advance failed to overtake the Sector “in one single flash movement” and the other Krajina Sectors reacted strongly to the Croatian audacious operation. The Serbs in Sector North fired seven missiles (Orkan) towards Zagreb, hitting the Croatian Capital in the Airport (Pleso) and the central of Town. There were “Air Raid” sirens alarming the population to take cover and it looked like a scene from the Second World War. The Orkan missile attach to Zagreb had caused seven deaths and 205 wounded.
In Bosnia the situation escalated from “tense but calm”, to “very dangerous”, due to the outbreak of combats between Bosniaks and Serbs in several locations of the separation line.
On the 3rd of May 1995, it was all over. The Serbs had lost their possession of Sector West and
Operation Flash was the first one of a series of military operations, planned to finish definitively the “Croatian War of Independence”. There was no more Serbian authority in Sector West. In fact, that reference completely disappeared from all maps; there was no more Krajina in that zone, only Croatia.
During the three days of combat, the Croatian forces suffered 42 fatal casualties and 162 wounded. The Serbs suffered 283 fatal casualties, 1.200 wounded and over 14.000 displaced people, which became refugees in the Serbian territories of Bosnia, giving a humanitarian dimension to the problem.
One month after Operation Flash was finished, there were only 1.500 Serbs living in that region. A ridiculous number when compared with the several dozens of thousands that lived there before. The UN was now concerned with indications of ethnic cleansing perpetrated by Croats over the Serbian families.
Regardless who did what to whom, ethnic cleansing in that conflict reached levels of unsinkable brutality. The farm animals were shot down or burned alive in the corrals; people were tortured and killed merciless, in spite of their age, sex or social status. The cadavers were thrown into fresh water wells in order to contaminate the populations’ drink water. In urban zones the water tanks were poisoned with rat poison, diesel fuel and oil. The houses were destroyed and the cemeteries vandalized. The population of entire villages was forced out of their houses and the accesses were mined and booby trapped for them not to return … ever.
Back in 2012, right after arriving to Kabul, I was made aware that I should be permanently cautious, wherever I was, because my head was worth 20.000 US Dollars (USD). That was how much the Taliban shadow Government would pay anyone that would kill a foreigner officer.
That specify price made me wonder if there was a list of targets and rewards; a “Taliban price list” … and there was. In fact, it was published in a Taliban social network site permitting anyone interested to have access to it. In their propaganda, the Taliban distorted the Afghan Mujaheddin concept, and turned it in some sort of an invincible religious “Jedi”; a “Mu-Jedi-in”; attracting all sort of unemployed/uneducated and starving youth to their cause. Being a martyr for the cause was their ultimate glory.
Death in combat was not something they feared, but rather wished.
But there was a material aspect to take into consideration. The salary of a Taliban mujaheddin fighter was about 10 USD per day. Furthermore, the fighter could increase significantly his payment according to a “list of interesting targets” (and if the fighter would die on the process, his family would receive the price).
According to a Taliban website, the price list was:
200 USD – Attack and destroy a bridge;
200 a 400 USD – Assassination of a teacher/professor;
900 USD – for attacking a school and avoiding continuation of lecturing;
1 000 USD – For each ISAF low ranking soldier killed;
6 000 USD – For the destruction in combat of an ISAF vehicle;
7 500 USD – For the poisoning of Afghan military/policeman in their units/posts;
10 000 USD – For the bombardment (rockets) of a City;
10 000 USD – For the complete destruction of a school;
and … 20 000 – For the capture and beheading of a foreigner military Officer.
In a countryside with long traditions of war-fighting and manhood culture, where most males had a weapon of their won, receiving such high payments represented the assurance of well being for an entire family. That was something worth thinking about, regardless their sympathy towards the international presence in their lands.
Em 2012, aquando do check-in na missão das Nações Unidas em Cabul-Afeganistão (UNAMA), uma das coisas que era dita logo à entrada era:
– “Mantenham sempre uma atitude vigilante em relação à vossa segurança, porque a vossa cabeça vale 20 000 Dólares Americanos (USD)”.
Era quanto o Governo Sombra Taliban pagava pela captura e decapitação de um oficial estrangeiro. Essa quantia fez-me questionar se havia uma “Lista de Preços” para pagamentos dos Taliban fui surpreendido com um arrastado “Yesss”. Efectivamente, os Taliban usavam com mestria as redes sociais para as suas campanhas de propaganda, distorcendo o conceito Afegão de Mujahedin, tornando-o numa espécie de “Jedi” religioso Invencível – um “Mu-Jedi-in” – atraindo muitos jovens desempregados, sem educação e esfomeados para a sua causa. A glória máxima que um Mu-Jedi-in poderia ambicionar era ser um “Mártir” taliban.
Eles não receavam a morte … pelo contrário, desejavam.na.
Contudo, havia um aspecto mais pático e materialista a adicionar nas acções de recrutamento dos Taliban – o pagamento das acções de combate (que, em caso de morte seriam pagas à família). Um insurgente Taliban ganhava, em média, 10 USD por dia. Mas essa verba poderia ser significativamente aumentada, de acordo com uma lista publicada num dos sítios da internet dos Taliban.
200 – Pelo ataque e destruição de uma ponte;
200 a 400 USD – Pelo assassinato de um professor;
900 USD – Por um ataque a uma escola que previna a execução de aulas;
1 000 USD – Por cada soldado (baixa patente) estrangeiro morto;
6 000 USD – Pela destruição em combate de um veículo da ISAF;
7 500 USD – Pelo envenenamento de militares/polícias Afegãos no seu posto;
10 000 USD – Pelo bombardeamento (rockets) de uma cidade;
10 000 USD – Pela destruição complete de uma escola construída pela ISAF;
e … 20 000 USD – Pela captura e decapitação de um oficial estrangeiro.
Num País cujas raízes seculares estão ligadas à Guerra, com uma cultura de honra e masculinidade muito medida em sangue, onde qualquer homem tem uma arma à disposição, receber valores como os acima apresentados faz pensar muita gente … especialmente se levarmos em consideração o bem-estar da respectiva família. Algo muitíssimo tentador, independentemente da simpatia que os afegãos pudessem ter pela (forte) presença estrangeira no seu território.
Em 1992, enquanto cumpria missão no Programa para o Desenvolvimento das Nações Unidas (PNUD/UNDP) ao serviço da UNAVEM em Angola para gerir a actividade aérea da ONU na Província de Moxico/Luena, tinha de coordenar as necessidades de transporte aéreo da Comissão Eleitoral do Moxico com a capacidade de meios aéreos que a ONU tinha em Luena. Todos os finais de tarde a Comissão eleitoral providenciava as suas necessidades de voos para o dia seguinte, informando quais eram os destinos no vasto território do Moxico (a maior Província Angolana). Em muitas situações, esses locais não passavam de ajuntamentos de cubatas, os quais nem sequer apareciam nos detalhados mapas que as tripulações disponham. Para resolver essa restrição, havia a necessidade de alguém a bordo a funcionar como intérprete/navegador, questionando os habitantes locais sobre a forma de chegar a essas povoações desconhecidas. O eleito era, obviamente, o (único) Português do team aeronáutico da ONU em Luena.
Um certo dia, num desses voos em busca da “aldeia desconhecida”, voando um helicóptero MI-17 russo, aterrámos numa povoação para perguntar onde ficava uma outra aldeia onde deveríamos deixar material para o dia da votação. Quando estávamos prestes a tocar com as rodas no terreno reparei que os populares gesticulavam muito aflitos, tentando dizer para não aterramos ali. O piloto manobrou para pousar noutro local e, quando finalmente consegui falar com alguém, descobrimos que íamos colocar o pesado helicóptero num campo minado pela guerra. Após recebermos indicações sobre o nosso destino, descolámos de novo e lá encontrámos a povoação.
Aquela comuna era uma significativa congregação de cubatas, feitas de capim seco, barro e paus entrelaçados, e o piloto decidiu fazer uma volta de reconhecimento para escolher um local de aterragem. Após seleccionar o sítio ideal, no centro da aldeia, fizemos uma aproximação baixa, em velocidade reduzida, com o pesado MI-17 a passar sobre os “telhados das casas”. O sítio não era espaçoso, pelo que a tripulação estava muito atenta ao procedimento e ninguém estava a prestar atenção aos arredores. De repente, ficámos envoltos em muita poeira, paus, pilhas de palha, papeis e penas de aves voando em redor do MI-17. O piloto Russo, jovem urbano habituado a coberturas de telha, não levou em consideração o material de construção daquelas habitações e perdeu o contacto visual com o terreno. Aflito com aquele desenvolvimento, o piloto chamou-me através do intercomunicador, perguntando o que estava acontecendo.
Eu limitei-me a responder: ” Check your six” (olha às tuas 6 horas)”
Uma fraseologia aeronáutica da Segunda Guerra Mundial que significa “olha para trás”
Tínhamos destruído tudo à nossa passagem. Podia-se identificar o rumo da nossa aproximação pela quantidade de capoeiras e telhados de colmo destruídos pelo down-wash do rotor do helicóptero.
No chão, a população estava muito irritada, com a gente gesticulando de forma hostil. Nós avaliamos a situação e entendeu-se que não havia nenhuma maneira para aterrar naquele local, sem colocar em risco a segurança da população, e a nossa própria segurança após aterrarmos.
Abortámos a missão e regressámos a Luena. O relatório da missão passou a constar:
Back in 1992, in my UNDP mission in Angola, I was responsible to coordinate the UN air activity in support of the needs for air transportation of the Angolan Electoral Commission in the Province of Moxico. Every late afternoon the Electoral Commission would present the list of cargo and persons to be airlifted to specific destinations. In most cases, those destinations were no more than a modest gathering of straw and mud made huts, in the middle of nowhere. Some villages were not even plotted on the maps, requiring someone (me) to join the flight as a navigator/interpreter, and ask the locals where to go in order to reach the destiny.
One day, we were flying in a helicopter to one of such (unknown) destinations, and we had to do a “stop and go” in a certain village and ask how to get to the place we were supposed to go. When we just about to touch down on a nice open area, we could see through the windows of the aircraft the locals gesticulating very intensively, signing us not to land there. We landed in another place and found out we were about to touch down in the middle of a mine field. After some short explanation from the locals, we finally located on the map where our destination was, and we took-off again.
Upon reaching the village we were looking for, the pilot decided to over fly the location, in order to find a place to land and deliver the material for the elections that we had on board. He found the perfect place right in the center of the village and maneuvered the heavy MI-17 helicopter on its final approach to the landing site. What the gentile (urban) Russian pilot did not take into consideration was the construction material of the small huts bellow the “down-wash” of his MI-17. Those dwellings were made of straw, dry mud and wood sticks; far too fragile (and light) to “survive” the strong down-wash of the low level fly-by MI-17 helicopter. Suddenly, we were flying in the middle of a thick cloud of dust, straw, sticks, papers, chicken feathers and what have you.
I only had the time to tell the pilot: – “Check your six!” – which means look at your back. The path the helicopter had just flown could be perfectly identified by a straight line of roofless huts and destroyed henneries. The population was (understandably) not happy with our performance and many people started to gather into a mob, showing a not so friendly attitude towards our helicopter. After analyzing the situation, we found out that we didn’t have conditions to land the aircraft, without endangering the local population and risking the safety of our helicopter. Therefore, the pilot decided to abort the landing and we flown away, back to the UN base in Luena. That small village, which I don’t even remember its name, did not get the chance to vote in 1992, during the first free elections of Angola.
Em 1992, devido ao agravamento do conflito na Bósnia Herzegovina e nas Krajinas Sérvias da Croácia, o Conselho de Segurança das Nações Unidas decretou uma Zona de Exclusão Aérea (No Fly Zone) sobre aqueles territórios. O objectivo era evitar que o Exército Nacional Jugoslavo utilizasse o seu esmagador “poder aéreo” naquele conflito.
Por forma implementar as medidas necessárias para a efectivação da No Fly Zone, a ONU passou um mandato à Aliança Atlântica (OTAN-NATO) para vigiar e interditar aquele espaço aéreo. No início de 1995, a NATO já tinha executado mais de 60.000 saídas de aeronaves de combate e/ou vigilância, no âmbito da No Fly Zone sobre a Bósnia/Krajinas.
Contudo, a ONU também tinha a sua própria capacidade de vigilância do espaço aéreo interdito, através do núcleo de Airfield Monitors, do Departamento de Observadores Militares (UNMO) da missão UNPROFOR. Portugal contribuía para esta capacidade da ONU com oficiais da Força Aérea qualificados em operação radar.
As equipes de UNMO Airfield Monitors operavam em locais relevantes para a monitorização da actividade aérea das facções em conflito (maioritariamente Sérvios/Jugoslavos mas também Croatas e Muçulmanos).
Um dos locais mais relevantes para aquela capacidade ONU, eram as estações radar dos Centros de Controlo Aéreo de Área (ACC) de Zagreb – Croácia, e Belgrado – Jugoslávia.
A terminologia “No Fly Zone” era alvo de menções jocosas e trocadilhos brincalhões, uma vez que a palavra “Fly” (em Inglês) é a mesma para “voo” e para “mosca”. Desta forma, No Fly Zone poderia ser traduzido por “Zona Interdita a Moscas” (ou a insectos voadores).
Com a NATO e a ONU a usarem radares para vigiar o espaço aéreo de cima para baixo e de baixo para cima, dificilmente uma aeronave não autorizada poderia voar sobre a Bósnia sem ser detectado e interceptado … ou, pelo menos, andávamos convencidos disso. Porém, os pilotos transgressores conheciam todos os truques que evitavam a sua detecção.
No entanto, independentemente das artimanhas utilizadas pelas tripulações prevaricadoras, de janeiro 1995 a julho desse mesmo ano, a Equipa UNMO Airfield Monitor de Belgrado detectou 130 violações da No Fly Zone, sendo que a sua esmagadora maioria pode ser validada por outras fontes de informação. Os relatórios dessa equipa acabaram em cima da mesa de trabalho do Conselho de Segurança da ONU, e contribuíram grandemente para a decisão (1995) de estender por mais sete meses as Sanções ONU à Jugoslávia de Slobodan Milošević.