Uma tertúlia poética, numa fábrica de pólvora

A Fábrica da Pólvora de Vale de Milhaços (uma componente do acervo do Ecomuseu Municipal do Seixal) recebeu no dia 26 de outubro a 5ª Tertúlia de Poesia, cumprindo desta forma uma tradição semestral que já dura há mais de dois anos.

Desta feita, os 13,5 hectares da antiga fábrica receberam oito (8) poetas convidados, tendo cada um declamado dois dos seus poemas em locais distintos do recinto. Numa constante caminhada por entre edifícios e matagal, os participantes não só assistiram à declamação dos poemas, como puderam apreciar a biodiversidade preservada naquela área, a qual tem cerca de 585 espécies animais e vegetais catalogadas, e ainda receberam uma explicação detalhada da forma como a pólvora foi produzida naquelas instalações desde o Século XVIII. Os visitantes usufruíram dos profundos conhecimentos sobre aquela infraestrutura industrial que a doutora Graça Filipe (responsável pelo local) foi prestando ao longo de todo o percurso.

Receberam-se origamis com poemas, ouviram-se poemas teatralmente interpretados, poemas declamados, poemas cantados e até dançados por parte dos seus criadores.

No final, houve um período de “microfone aberto”, onde qualquer pessoa pode apresentar um poema ao resto da audiência, e depois foi visitada uma exposição fotográfica intitulada “Ilha da Biodiversidade” (de Mauro – o organizador do evento e ele próprio um poeta) e assistiu-se a um momento de música ao vivo.

Ficou a tristeza (inspiradora de poemas) de ver a degradação a que chegaram os edifícios da Fábrica da Pólvora de Vale de Milhaços. Algo que alguns (poucos) procuram desesperadamente fazer sair do pantanal do desapreço. Um local com alguma maquinaria museológica em perfeito estado de conservação, que até tem uma gigantesca máquina a vapor a qual, embora antiquíssima, está bem preservada e certificada para funcionar.

Parabéns à organização, parabéns à estrutura zeladora do património do Ecomuseu do Seixal, …, em maio de 2025 haverá mais poemas … assim houvesse mais capacidade de investimento na preservação da Fábrica da Pólvora de Vale de Milhaços.

Destaco este poema de Cláudia Carola, que, no contexto internacional da atualidade, me tocou particularmente.

Eu Portugal
Estou à beira mar plantado 

País de grandes tradições

Tenho na voz o triste fado

Uma história de milhões

Descobri o mundo inteiro

Em caravelas pequenas

Cheguei sempre em primeiro
Sem GPS nem antenas
Sou pequeno na geografia

Sou enorme na antiguidade

Descobri a cartografia
Dividi o mundo em metade
De escritores bons a poetas
Tenho tudo nas minhas gentes
Aqui não se fazem jamais dietas

À Volta da mesa sempre presentes
Tenho estórias para partilhar

Em bailes dos Santos populares

Venham lá todos comigo dançar
Nestes bailaricos peculiares
Por vezes mal compreendo

Fico no meu canto bem quieto

Às vezes também sou esquecido

Partilho a dor no meu soneto
Nem tudo é perfeito bem sei

Há muito trabalho a ser feito

Mas sempre o melhor eu dei

Estou longe de ser perfeito
Ah gentes desta minha terra

Agradecei este vosso cantinho

Onde há sol e não há guerra
Onde há bom pão e bom vinho.

Publicado por Paulo Gonçalves

Retired Colonel from the Portuguese Air Force

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