Estórias de missão – Boutrus Ghali impõem respeito à ONU (Bósnia 1995)

Um dia, no ano de 1995, durante a missão das Nações Unidas na Bósnia Herzegovina – UNPROFOR – ocorreu um episódio numa equipa de Observadores Militares da ONU (UNMO) o qual, para além de estranho, era no mínimo anedótico. Contudo, quem o contava jurava que tinha realmente acontecido.

Numa das zonas Sérvias da Croácia – na Krajina do Sul – a esquadra de polícia local recebeu uma queixa contra o Secretário-Geral das Nações Unidas – Boutrus Ghali. De acordo com o queixoso:

– “Butrus Gali é perigoso e tem a tendência de morder às pessoas que entram nas instalações das Nações Unidas. Deve de ser acorrentado a um poste de segurança ”.

Depois da estupefacção inicial, a cena clarificou-se: o queixoso referia-se ao cão mascote da Equipa UNMO da localidade, o qual guardava com zelo o perímetro cercado da vivenda alugada onde a equipa da ONU residia e trabalhava. Aquando da escritura da queixa o homem referiu-se ao animal pelo nome (que toda a gente conhecia), mas não mencionou que se referia a um cão.

Essa equipa de Observadores Militares da ONU havia adoptado um cachorro bonacheirão, ao qual, por brincadeira e carinho, haviam dado o nome de Butrus Gali – o nome do Chefe máximo da ONU – mas escrito de forma distinta para não ofender o original. O cachorro entretanto foi crescendo e transformou-se num mastim que, embora dócil e brincalhão para com os capacetes azuis, era particularmente zeloso pela guarda do perímetro da casa. Nenhuma pessoa estranha à equipa deveria ter a ousadia de entrar sem se fazer anunciar primeiro, a fim de que os UNMO se certificassem que o cão não seria um problema. Era um procedimento simples, óbvio, e que estava em vigor há bastante tempo. Os elementos da equipa UNMO rodavam com o tempo, mas o animal permanecia sendo a mascote e nunca tinha havido problemas. Havia mesmo um sinal no portão exterior da vivenda que dizia (em Inglês e Servo-Croata):

– “Cuidado com o cão; faça-se anunciar”.

No caso do queixoso, o “cavalheiro” decidiu entrar no perímetro da ONU por motivos ainda por clarificar, à noite, sem se fazer anunciar nem tocar à campainha. Após passar a vedação e a meio do jardim da casa, teve um “encontro imediato do 3º grau” com Butrus Gali. Reconhecendo que havia cometido um erro grave, o “cavalheiro” optou por fugir em direcção aos portões, os quais conseguiu ultrapassar mas não sem antes levar uma tremenda dentada nos “gluteus maximums”. Obviamente que a queixa foi inconsequente, tendo o queixante que se justificar perante a polícia acerca dos seus motivos por ter entrado sem ser convidado e sem se fazer anunciar, à noite, na casa dos UNMO.

Quanto a Butrus Gali e aos UNMO, a vida continuou normalmente, somente com um acrescento no sinal de “Cuidado com o cão” onde se podia ler (também):

 – “CAUTION – Don’t fuck around with Butros Gali!

O outro Boutrus Ghali, o original, era uma pessoa muito querida dos UNMO da Bósnia e conhecido por ser afável e simpático, “incapaz de morder a quem quer que fosse”. Contudo, como o respeito pela UNPROFOR era muito baixo junto das fações beligerantes, este episódio teve o efeito de levantar o moral da comunidade UNMO.

Pena que tenha sido o Butrus Galiu errado a fazê-lo!

Publicado por Paulo Gonçalves

Retired Colonel from the Portuguese Air Force

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